Blog do Raul

Raul Seixas

Sabe o que é disruptivo?

Interrompe curso natural.

Ouvi pela primeira vez o termo “disrupção”, quando acompanhava palestra de uma de minhas filhas a estudantes e trainees da área de marketing, durante a pandemia. Juro que nunca ouvira antes e me apressei a buscar o significado no google e leituras específicas para ter uma ideia de onde ele se aplicaria.

Não é novo, mas pode-se dizer que é uma palavra da moda, sempre que se observa uma inovação em um produto ou serviço geradores de um novo mercado e que desestabilizam os concorrentes que antes o dominavam. Essa palavra está por trás das mudanças no mundo empresarial, na forma como consumimos produtos e serviços e no sucesso de empresas top do ramo tecnológico.

O termo foi batizado pelo professor Clayton Christensen, da Universidade Harvard, nos Estados Unidos, em um artigo publicado em 1995, que no bom português o seu significado está associado ao ato de romper, de interromper o curso natural, de gerar uma ruptura. A etimologia da palavra disrupção vem do latim disruptio.onis, ou seja, fratura, quebra.

Encontrei nessa pesquisa rápida para compartilhar aqui, que “disrupção” é substantivo feminino, que pode ser também perturbação, no sentido figurado, ou o salto de uma faísca entre dois corpos carregados de eletricidade. Mas com todos esses significados e significantes, o termo é usado coloquialmente mesmo no mercado empresarial e onde vivem os verdadeiros gestores do mundo globalizado.

Sempre me lembro dos tempos em que oferecíamos alguma resistência à globalização, teoricamente ou com algumas mobilizações mundo afora. A globalização remonta a era das grandes navegações e descobertas no século 16, quando houve o registro das crescentes trocas comerciais entre nações. Seu significado está associado à expansão econômica, política e cultural em todo o mundo.

De que forma? Com a aculturação, fundindo culturas, em decorrência do contato continuado, provocando a modificação cultural do indivíduo, grupo ou povo que se adapta a outra cultura ou dela retira traços significativos. Criação de blocos econômicos, expansão do capitalismo, presença de multinacionais, maior propagação de conhecimentos.

Nos anos 1990, os antiglobalistas propunham alternativas ao regime econômico capitalista neoliberal e aos blocos comerciais como o NAFTA – Acordo de Livre Comércio da América do Norte e a ALCA – Acordo de Livre Comércio das Américas, com o capitalismo keynesiano (protecionismo e equilíbrio econômico, intervenção estatal na economia, benefícios sociais etc), o socialismo, o comunismo, a anarquia e o fascismo, entre outras propostas mais inovadores, centradas nas necessidades da sociedade para combater as alterações climáticas, os danos ao meio ambiente e aos direitos humanos etc.

Contextualizando, para os nossos dias, em que o mundo se globalizou, por causa principalmente das inúmeras tantas facilidades tecnológicas, veja agora que esses horizontes não estão restritos ao planeta Terra, quando conhecemos as intenções e os planos do comprador do Twitter, Elon Musk, que se tornou a pessoa mais rica do mundo, em 2021, segundo a Bloomberg; mas no ranking da Forbes, em 2022, Musk ocupa o segundo lugar.

Ele é dono também da Tesla, fabricante de carros elétricos, e da Spacex, a primeira empresa no mundo a vender um voo comercial à Lua (marcado para 2013, mas não aconteceu) e a desenvolver um projeto multiplanetário, específico para a colonização de Marte, e para o desenvolvimento seguro da inteligência artificial.

Voltando, pois, à “disrupção”, vale trazer à reflexão as também chamadas “tecnologias disruptivas”, que consideram o estágio da qualidade inferior das inovações em relação aos produtos líderes do mercado, e que ganham terreno e prevalecem, globalizam. Como o Youtube, que abriu oportunidade aos vídeos caseiros e surpreendeu estúdios e produtoras; as câmeras digitais, desdenhadas pelos fotógrafos profissionais pela qualidade ruim das realizadas por amadores; as plataformas Netflix, Now, Amazon etc, que permitem o acesso online a filmes, documentários e séries, colocando uma pá de cal nas locadoras de vídeos, e por aí vai.

A internet tem sido um terreno fértil para reviravoltas e é humanamente impossível reagir contra os que nos batizam assertivamente de “metamorfoses ambulantes”. Eu prefiro, “do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo”, né Raul Seixas, meu xará!?

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Uma Rosa com Amor

Há rosas azuis no jardim da Democracia.

Aprendi com a escola e as orientações de meus mentores políticos, que na vida política, ou você tem vocação para servir o público, ou é melhor não tentar. Sem essa vocação, corre-se o risco de usar a política como escada para conseguir vantagens pessoais. Isso acontece em grande medida – e é o que causa o repúdio tão grande do povo aos políticos. Fernando Henrique Cardoso sempre acentuou essas afirmações, e as incluiu em seu livro “Cartas a um jovem político: para construir um país melhor”. E acho que hoje é um momento muito propício para refletir sobre a reafirmação de nossas convicções, que se construíram teórica e praticamente com a militância por ideais desde os tempos em que atuávamos no movimento estudantil secundarista.

Em diversos momentos da história do Brasil, dada a coincidência de bandeiras como a democratização, a normalidade institucional e a redução das desigualdades sociais, nos mobilizamos em busca do bem comum. Nessas ocasiões estivemos em agrupamentos comuns ou firmamos alianças políticas para fortalecer vozes com um número representativo e maior, e alcançar os alvos, no caso os centros decisórios, que em nosso país estão representados pelos poderes Legislativo e Executivo. O Judiciário era buscado quando esgotadas as chances de conquistas pela unidade da sociedade.

Meus parceiros mais acessíveis combinavam socialistas democráticos, social-democratas, liberais progressistas e democratas cristãos. O radicalismo permeava as ideias e objetivos a serem alcançados para o bem geral, havendo uma concentração de ações no convencimento da sociedade para que ela pudesse se sensibilizar e utilizar os canais democráticos de participação e representação políticas. A dicotomia esquerda versus direita sempre existiu e juntava militantes de um lado, não proprietários, do outro, elites influentes. O senso de justiça da maioria do povo sempre prevaleceu, entre os que se atribuíam a missão de obter o avanço das classes que viviam de seu próprio trabalho. A direita era composta de velhas facções das elites dominantes, com uma visão mais conservadora da sociedade e da ação política.

Nesse cenário construi minha história, reafirmando em muitas oportunidades que me mantive do mesmo lado, desde 1976, quando comecei a minha militância política e partidária. Contudo, faço questão de frisar que o meu alinhamento nunca foi incondicional com todas as forças políticas que se articulavam no mesmo arco de alianças. Acontece que dado o foco da nossa atuação, este lado era batizado de esquerda e mais tarde o meu campo se enquadrou como de centro-esquerda. Politicamente é assim que me apresento e localizo, embora haja hoje em dia um pensamento radical da existência apenas de dois polos, esquerda ou direita. Antes da queda do Muro de Berlim, em 1989, o patrulhamento ideológico determinava lados, principalmente no Brasil em que havia gente contra a democracia.

O patrulhamento ideológico e partidário existente nos dois campos, ao longo da história, hoje está muito presente e visível nas redes sociais. Estas permitiram a participação livre e irrestrita das pessoas, independentemente das suas convicções ou visões formadas a respeito das coisas à sua volta ou no próprio mundo. Os envolvimentos de figuras políticas do PT e de partidos mais aliados em circunstâncias eleitorais desde 2003, com o espetáculo da corrupção desenfreada – Mensalão e Lava Jato, para citar as principais denúncias, serviu de base para definir os lados na conjuntura atual. A população de eleitores negou confiança e voto naqueles que tinham algum tipo de ligação com essas denúncias e operações da Justiça e Polícia Federal, mesmo que pessoalmente limpas de qualquer participação.

Por isso, quando se pretende promover uma reavaliação dessa condição militante e se ligar mais com a maioria da sociedade, que desidratou os partidos políticos como o meu, PSDB, é necessário desarmar espíritos. Continuo caminhando e cantando, mas acho muito oportuno o poema-canção “Metamorfose Ambulante”, de Raul Seixas, em especial quando acentua que “É chato chegar a um objetivo num instante / Eu quero viver nessa metamorfose ambulante / Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo / […]”

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Nada é pra já

Na contramão da pressa…

Tomo emprestado a primeira estrofe do poema “Mudar”, de Clarice Lispector, que expressa: “Mude, mas comece devagar,/ porque a direção é mais importante/ que a velocidade […]”, pra tentar justificar decisões tomadas àqueles que nunca pararam um minuto para tentar saber o que tentávamos para o bem comum. Compartilho essa reflexão que parece boba, quando identifico parte das pessoas do meu convívio, ou não, manejando verdades de maneira apressada, rasa e crua.

Serve para qualquer cenário da vida cotidiana ou na internet. Do que acontece em casa, nos relacionamentos familiares, amizades, amores e amantes, no trabalho, na conjuntura política, nos olhares para o futuro. Vale o ditado de que a pressa é inimiga da perfeição, sem perder de vista o hino de Cazuza, à urgência de viver, a enaltecer que “o tempo não para!”

Busquei várias interpretações intelectuais, poéticas e de autoajuda, extraídas das melhores frases sobre pressa, a começar por Confúcio – “Coisa feita com pressa é coisa mal feita.”; passando por Oscar Wilde – “Não quero adultos nem chatos. Quero-os metade infância e outra metade velhice! Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa.”; e, fechando com Silvio de Abreu – “Não tenha medo, cautela, sim. Não tenha pressa, tenha tenacidade. Não tenha prepotência, mas consciência do seu valor. O que me deixa indignado é a impunidade, falta de caráter, manipulação da opinião pública, injustiça, puxa-saquismo, nepotismo, miséria, ignorância, estupidez, mentira.”

Ora, não pense que, ao se chamar atenção para a cautela na interpretação dos fatos correntes, embute-se um cale-se ou um apelo à tolerância. Há um prazo de validade dos fatos para que se tornem notícias. E é preciso dizer também que cautela não é censura, mas o mínimo de respeito que devemos ter com as pessoas à nossa volta ou em rede de domínio público.

Minhas leituras nos tempos recentes pautam os sentimentos de personalidades, perturbadas pela intolerância social e os seus abismos. É muita informação para digerir e pouca capacidade – educacional, talvez – de se interpretar e se sentir partícipe, respondendo ao que não lhe diz respeito ou ofenda suas crenças.

Por falar em crenças, já parou pra pensa-las e organiza-las, com seus valores, ideologias, militância em rede?

No passado recente, quem pensava e influía nos rumos da formação da sociedade vivia num invólucro. Gente que foi machucada pelo autoritarismo e falta de democracia no Brasil e por aí afora. Era praticamente impossível avançar e beber desse conhecimento, além dos artigos e livros que produziam. Os espaços de interatividade eram escassos, mas nunca foram infalíveis. Os dispostos em aprofundar mais sempre existiram, mas o exercício do contraditório carecia de preparo e conteúdos com fundamentos.

Hoje, não! A contemporaneidade valorizou o politicamente correto, como cultura globalizada e por vezes chata, “sofisticando” (#sqn) a visão geral das coisas. E não demos conta que é possível ler o cotidiano como Raul Seixas, que preferia ser “metamorfose ambulante, do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo”, para dizer o oposto do que disse antes.

Amós Oz escreveu em 2004, que “a síndrome de nossa época é a luta universal entre fanáticos e o resto de nós. O crescimento do fanatismo pode ter relação com o fato de que, quanto mais complexas as questões se tornam, mais as pessoas anseiam por respostas simples. O fanatismo acredita que, se alguma coisa for ruim, ela deve ser extinta, às vezes junto com seus vizinhos”.

Portanto, se conseguiu ler este texto até o fim, complete as reticências, sem pressa, porque quem responde com pressa, como registra um provérbio árabe, raramente acerta …

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