Blog do Raul

Vila Belmiro

Sonhei com o meu chalé

Era uma casa apertada e cabia tudo.

Quando cheguei a Santos, em 1971, fui morar no bairro Campo Grande, que fica entre o Marapé e a Vila Belmiro. Era um chalé de madeira, alugado, onde cabiam os meus pais e irmãos (1 menino e 2 meninas). Hoje esse chalé, resquício das tradições portuguesas em nossa cidade, não existe mais, porém o reencontrei num sonho nessa madrugada de domingo, que me despertou, de tão real e bacana.

Enquanto caminhava por um lugar desconhecido, ruas bem cuidadas, flores e pessoas simpáticas por todos os lados, avistei uma casa de madeira num sopé de morro, que me parecia familiar. Parei para enxergar melhor e identifiquei alguns detalhes do meu chalé em Santos.

Bateu uma saudade dos tempos em que vivemos todos apertadinhos e felizes na adolescência. O orçamento familiar não permitia um lugar maior ou melhor, então periodicamente nós pintávamos as paredes, conforme o estado de espírito da família – ora verde musgo, verde claro, azul claro, amarelo. Enfim, quem quer ter um lar, cuida, sem grandes investimentos. Vale a vontade, o capricho e o desejo de evidenciar a harmonia donde vivemos.

Era o meu chalé montado noutro lugar. Me aproximei do portão de entrada e bati palmas para perguntar aos seus novos moradores. Mas não era residencial, e me autorizaram entrar e confirmar se eu não estava confundindo as coisas, tipo uma demência precoce ou coisa assim. Afinal, esse chalé fazia parte de uma memória passada e logo lembrei também de mamãe que foi acometida de Alzheimer.

Eram as mesmas madeiras, ainda na cor da nossa última pintura, por volta de 1978, com um mobiliário moderno e aconchegante. Diferente das nossas camas beliche e parede de duratex pra dividir um quarto em dois e caber nós 4, mas restavam 3 coisas do nosso tempo, numa vitrine: uma imagem de Cosme e Damião, um porta lápis de madeira com a impressão da marca Corona (de rolhas e tampinhas de garrafas), conosco desde o início dos anos 1960, e a minha máquina de escrever Remington.

Tudo me parecia familiar e não me cansava de repetir que essa tinha sido a minha casa, desde 1971, na rua Evaristo da Veiga, Campo Grande, em Santos. Os novos donos da casa negavam, mas não sabiam explicar também como chegaram ali ou como a casa foi remontada e os nossos objetos de fé e trabalho estavam bem mantidos.

Não perca de vista, leitor, que isso tudo aconteceu no meu sonho nessa madrugada de domingo de outubro de 2021. Mais de 50 anos depois da minha chegada a Santos com os meus pais e irmãos. E prossegui:

De repente, estava noutro lugar. Um tipo bar chic e com móveis vintages, luminárias afins, pratos e drinks daqueles filmes antigos em Nova York. Mas o tema era o mesmo. Como existe ainda o meu chalé, apesar de agora parecer um studio de arte, mesclando o contemporâneo com as nossas coisinhas simples da história de nossas vidas.

Entabulei referências sobre o que sabia da nossa casa em Santos, antes de meu pai alugá-la. Nada mudava o semblante dos meus anfitriões no sonho, eis que me veio uma das histórias fantásticas e pus na roda.

Perguntei-lhes: __ sabe quem morou antes de nós, nesse chalé!? Pela primeira vez eles pararam de falar e todo o ambiente dissipou, como estivéssemos num local deserto, em ponto ignorado desse mundo.

Antes que respondessem, fui logo dizendo: __ Leny Eversong. A cantora brasileira, que cantou com Elvis Presley, cujo marido foi preso em Santos na época da ditadura, confundido com um militante de esquerda, e achado morto algum tempo depois.

Acordei, porque fiquei com vontade de falar mais sobre ela, pessoa tão importante que certa vez me disseram que havia morado no meu chalé. Desperto, corri pro Google. Não confirmei essa história, que morou no Campo Grande em Santos, mas curiosamente li que ela fazia aniversário no mesmo dia que eu – 10 de setembro. Se Leny Eversong fosse viva, teria completado 101 anos em 2021.

Agora quero saber mais sobre a sua história, Hilda Campos Soares da Silva, nome real de Leny Eversong, que em 1958, ano em que nasci, já cantava no Olympia de Paris.

Se vc que leu até aqui souber mais sobre a história de Leny Eversong em Santos, me chame no Messenger ou por e-mail: [email protected]

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Encanta Santos FC !

A nova geração de meninos da Vila Belmiro contagia o Brasil pela exuberância do futebol com a camisa do Santos Futebol Clube e pela alegria adolescente nos gramados após cada gol. Hoje, quando o Santo André marcou primeiro, estava me confraternizando com amigos no Heinz Bar em Santos e percebia o desalento em muitas mesas vizinhas à minha. Diga-se de passagem que alguns corintianos vibraram com esse gol, mas desde antes do início da partida havia um grito de campeão guardado no peito de cada um, mesmo sabendo que o campeonato paulista será decidido em dois jogos.

O Santos teve pela frente um adversário que também impôs respeito ao longo da disputa para dividir as atenções nesse confronto. Exceto os corintianos, que representam uma parcela ínfima da população santista, não se percebe uma cidade dividida em relação ao objetivo do título de campeão. Isso ficou ainda mais claro no segundo tempo do jogo, que devolveu as coisas aos devidos lugares, com a virada do Santos e o placar final de 3 a 1.

Esta é a segunda vez que falo de esporte neste espaço. A primeira foi quando assisti pela TV o futebol feminino brasileiro, na seleção comandada pela Marta. Isso acontece hoje por conta do momento atual do futebol brasileiro, prestes a embarcar para a África do Sul e disputar outra Copa do Mundo, com elevados índices na expectativa da torcida pelo hexacampeonato. E os preparativos para essa disputa passam pelo desempenho do Santos, principalmente pelo grau de atenção e de envolvimento que a equipe atual vem despertando em torcedores mais aficionados ou simplesmente nos caronas da programação esportiva, acordados pela graça dos meninos-gol.

Conheço vários torcedores de outros clubes que já mudaram de preferência na torcida. No passado essa atitude de mudar de camisa de time de futebol era “grave”. Mas muita gente está convencida e inclusive se utilizam dos argumentos da letra de “Metamorfose Ambulante”, de Raul Seixas, que relata sobre a preferência de metamorfosear, de mudar de idéia e de posição, do “que ter aquela velha opinião formada sobre tudo”. Peço que reflitam, então, sobre torcer para outro clube, como uma atitude menos grave do que esquecer idéias e compromissos que interferem muito mais na vida das pessoas, dos cidadãos e do próprio país.

Relação com o clube para mim tem a ver com o coração, com um novo amor. Penso assim agora, porque sempre estive do mesmo lado político, ideológico e eleitoral, por exemplo. Minha descendência espanhola em nada influenciou a minha opção anterior de torcida. Influenciado pelo meu saudoso pai, a torcer pelo Palestra (Sociedade Esportiva Palmeiras), clube que tenho a maior de todas as simpatias desde criança, acho mais honesto confessar a quem possa interessar que sou um daqueles que não conseguiu resistir ao futebol espetáculo dos meninos Neymar, Ganso, André, Wesley, Robinho e todos os outros.

Com frequência vou ao estádio da Vila Belmiro assistir às partidas e não escondo a minha comoção durante os 90 minutos das partidas. Quase infartei na disputa recente de Santos e Palmeiras. Solitário no meio de uma torcida forte, aguerrida e sofrida pela derrota ao Palmeiras, atravessei a dimensão daquele momento para me refugiar no Twitter e revelar a minha “contrição”. Ainda bem que sobrevivi para relembrar que esses conflitos vinham desde os tempos de Pelé, Dudu, Ademir da Guia.

No início dos anos 70, quando cheguei a Santos, vindo do interior de São Paulo (Brotas), frequentava a Vila, inclusive nos horários de treinamento do Santos, durante as minhas férias de trabalho. Confesso que a emoção era semelhante diante do meu campo de visão atual, mais maduro, sabendo escolher pelas minhas próprias convicções. Creio que a partir de agora, com a clareza da minha torcida convicta por dois clubes, Palmeiras no sangue e Santos no coração, nada mais oportuno que aproveitar este momento para difundir uma palavra de ordem, como sempre fiz nos momentos políticos decisivos de nosso país, para que a CBF e o atual técnico Dunga da seleção brasileira, também mudem de opinião, convocando do Santos, além do Robinho, Neymar e Ganso! Pronto, falei!

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Santos é boa para dormir no Carnaval !

Santos fica muito silenciosa no carnaval. Percebi isso este ano, quando optei por ficar na cidade e caminhar pelas praias do Gonzaga e Boqueirão, sem ouvir uma marchinha ou batucada nas barracas dos clubes e associações instaladas na areia. Na televisão, por exemplo, ví que até em São Luiz do Paraitinga, vítima quase fatal nas últimas enchentes, havia bloco de foliões nas ruas. Por aqui, nas semanas que antecederam o feriadão prolongado, exceto no centro da Cidade, onde a prefeitura promove o “Carnabonde”, isolada e de maneira contida as tradicionais “Segura no Bagre” e “Raparigas do Último Gole” ainda respiram sem qualquer apoio, como mero ensaio para desfilar apenas na nossa imaginação. Acho que Santos está perdendo terreno com esse silêncio forçado por um acontecimento violento ocorrido em 1997, ao contrário do Rio de Janeiro, Recife e Salvador, por exemplo, que reúnem milhares de pessoas sem maiores problemas com a segurança dos seus participantes.

Restou relembrar nas esquinas e nos bares, a saudade da alegria de todas as idades nas principais ruas e avenidas de Santos até 1997. Naquela ocasião, uma atitude isolada caracterizada mais tarde como uma briga de gangues, no meio de cerca de 35 mil foliões que seguiam a Banda da Serra (promovida pela emissora Serra do Mar FM) no Gonzaga, resultou na morte de dois adolescentes e em ferimentos em outros dois baleados. Houve pressão da imprensa regional e dos órgãos de segurança e o prefeito da época (Beto Mansur) resolveu proibir os desfiles e a apresentação de trios elétricos na cidade, a pretexto de “defender a família santista”.

Depois de várias negociações com os organizadores do carnaval santista, a Prefeitura definiu critérios rígidos, inclusive obrigando-os a contratar serviços de segurança particular em número proporcional ao número de participantes limitado a 5 mil pessoas, quando tradicionalmente atraíam 40 mil pessoas de todos os lugares da cidade, da região e turistas. Não bastasse isso para tentar inibir novas ações de violência, uma nova onda de pressões realizadas por moradores da orla da praia passaram a reclamar também do som altíssimo dos desfiles e dos deslocamentos do trânsito da região.

Recentemente, esse mesmo tipo de pressão quase que suspendeu a apresentação da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo, que nos últimos três anos brindou a todos, no primeiro dia do verão em dezembro, com um espetáculo clássico maravilhoso a beira mar, por causa do “barulho” sinfônico. Uma atitude absurda, mas que conta com o amparo da legislação e dos poderes constituídos (Prefeitura, Judiciário, Ministério Público e Polícia) e que não deixa de ser um contrasenso para uma cidade que hesita na sua definição e/ou opção entre a vocação pelo turismo ativo ou pelo condomínio do repouso e dormitório.

Sem dúvida Santos têm muitos outros atrativos além das suas praias. Há uma diversificação de atrações para satisfazer diversos públicos, desde a contemplação dos jardins considerados os maiores e mais bonitos do mundo, passando pela riqueza do seu patrimônio histórico e cultural no Centro, eventos esportivos, restaurantes e a Vila Belmiro. Mas Santos pouco oferece de atrações ativas para a juventude e para os passageiros das centenas de cruzeiros marítimos que embarcam e desembarcam do seu Porto. Santos não tem hotelaria a altura de uma cidade capaz de abrigar esse contingente de turistas e se contenta com o título de ponto de passagem e sossego.

Urge reagir a aceitação desse estado atual e avançar para sacudir as suas estruturas, justamente porque haverá movimentação econômica e a cidade não ficará submetida ao sofrimento de tantos avós aflitos com o desemprego de seus filhos e netos. Relembrem as suas participações na “Banda Mole”, para aqueles que sempre foram do “remelexo e do “bole bole”, ou no “Banho da Dona Dorotéia”, quando homens emprestavam e rasgavam os vestidos femininos e em desuso na família. Mirem-se na paparicação dos blocos, corsos e bandas do Rio de Janeiro, Recife, Salvador, Brasília, São Luiz do Paraitinga, Itu, Iguape…

Tomo como base de uma proposta o alerta feito pela dissertação de Fernando Burgos Pimentel dos Santos, sobre o tema “Estado, política cultural e manifestações populares: A influência dos governos locais no formato dos carnavais brasileiros”, apresentada a Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, em fevereiro de 2007 – http://www.gv.br/scripts_inst/catalogo_titulados/SHOWPDF.ASP?ALUNO=62060100792 que descobri no google ao pesquisar sobre a natureza da opção de Santos, forçada ou não, pelo silêncio e pela tristeza em pleno carnaval. O autor destaca que embora “sejam sempre afirmadas como muito importantes, as políticas culturais ainda não recebem, na prática, a mesma atenção que outras políticas sociais”.

São muito bem-vindos ao debate, o prefeito de Santos, João Paulo Tavares Papa; o vice-prefeito de Santos, Cacá Teixeira; o secretário da Cultura, Carlos Pinto; a secretária de turismo, Wania Seixas; o diretor-executivo da Agência Metropolitana da Baixada Santista, Edmur Mesquita; o Santos e Região Convention Bureau; a Associação Comercial de Santos, o Sindicato do Comércio Varejista, a Liga das Escolas de Samba e todos quantos se interessarem pelo tema e por uma cidade segura, alegre, mas para todos!

Ilustração/foto do “Carnabonde” no Centro histórico de Santos.

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