Tardei um pouco, mas não podia deixar de comentar o silêncio forçado de Hugo Chávez. Antes do referendo sobre a reforma constitucional na Venezuela, para lhe favorecer inclusive com reeleições ilimitadas, Chávez lançava ameaças aos opositores e até aos jornalistas correspondentes estrangeiros. Calado agora pelo povo venezuelano, com o resultado desfavorável por uma diferença mínima, justifica também a sua derrota a uma pretensa "chantagem" da oposição, segundo a qual uma onda de violência seria iniciada com a vitória do "sim".
O presidente Lula (PT) serviu de cabo eleitoral do chavismo, quando saiu em defesa do modelo democrático comandado pelo seu companheiro de travessia "socialista". E como este blog pretende ser verdadeiramente democrático e plural, colecionei comentários favoráveis e contrários sem filtros ou qualquer tipo de censura, no auge da consideração lulopetista de que a Venezuela vivia um excesso de democracia.
A meu ver, Chávez foi longe ao tentar se aproveitar dos canais democráticos, para implantar o seu modo autoritário de ver e exercer o poder. Vale a pena enumerar as suas principais propostas na derrotada reforma constitucional, para refletir se não estamos sendo preconceituosos com a "nova esquerda da América do Sul":
- o presidente passa a ser eleito indefinidamente;
- com maioria simples na Assembléia Nacional, o presidente pode nomear e destituir governantes de cidades e províncias;
- o presidente passa a nomear o governador de Caracas, que passa a se chamar "Berço de Bolivar, o Libertador, e Rainha de Warairarepano";
- redefinição das formas de propriedade pública (do Estado); social (do povo, mas controlada pelo Estado); privada (pode ser confiscada se afetar o interesse da sociedade); coletiva (de grupos sociais, sob controle do Estado); e mista (privada e estatal, controlada pelo Estado);
- a destituição dos juízes do Tribunal Supremo de Justiça passa a ser feita com maioria simples;
- atribuição de poder de polícia às Forças Armadas e criação de uma quinta força;
- fim da autonomia do Banco Central…
A vida nos ensina, especialmente àqueles que dedicam parte do seu tempo às lutas pela organização da sociedade, que o desejo e as ações por mudanças nos levam ao campo progressista, de esquerda, à busca do bem estar coletivo. Isso gera um grande conflito, quando a associação de Chávez com a "opção pelos pobres" e a revolução é contraditória diante do seu temperamento grosseiro, autoritário, ameaçador.
Acho difícil defender o modelo chavista de democracia, tanto pelas razões expostas quanto pela sua revelada disposição de impor limites à informação, à autonomia universitária, ao livre comércio, à paz. Revejo minha posição sobre o tempo deste comentário, que no seu desenvolvimento não me pareceu tardio, porque ele pode servir para nos despertar para o debate, num momento em que Lula deseja a re-reeleição, Evo Morales os mandatos ilimitados…
Caro Raul
A vitória do “não” foi muito apertada. E não podemos esquecer dos cerca de 48% de abstenção, algo muito significativo numa situação como essa. Por isso, devemos não comemorar demais, porém ficar alertas com um possível golpe de estado naquele país.
Caro Raul, será que se na Venezuela existisse o sistema parlamentarista Chávez conseguiria chegar nesse nível paranóico que chegou? Isto me leva a perguntar porque no PSDB, que é parlamentarista desde sempre, não vemos nossas lideranças defenderem com a garra necessária as vantagens tão nítidas do sistema. Com certeza propiciaria um debate tão forte que contaminaria nossos vizinhos. E uma grande reforma partidária não teria escapatória em caso de aprovação em plebiscito. A pergunta é; será que nossos candidatos presidenciais não estarão pensando como sempre em benefício próprio (pôxa, logo agora que é minha vez?). Gostaria de você colocasse no blog sua opinião.
E que também porque nossos Senadores até agora não fecharam questão sobre a CPMF. Vamos continuar tendo que ouvir das pessoas que somos uma oposição ridicula?
um abraço
fausto ivan
…Caro Raul,
Como já disse anteriormente a América Latina é ímpar neste planeta. Acho muito estranho essa história de nova reeleição de Lula. Isso é fato plantado pelos “espertos” de sempre. Lembro-me bem que o “Princípe” lutou muito p/ aprovar seu projeto pessoal de reeleição ( e todos sabemos a que custo…). Depois, quiseram impedir o Lula de se reeleger, ou seja, mudar as regras durante o Campeonato!!! Pois é ( lembro tb. que a idéia era governar por 24 anos, 8 de FFHH, 8 de Serra, e mais 8 de Alckmin ou Aécio Neves..). Pergunto se é democrático privatizar setores essenciais, vitais à sociedade, como o setor energético, por exemplo, sem consulta popular. Nenhum deputado ou senador tinha autoridade p/ legislar sobre assunto tão importante sem consulta popular ( nem FFHH e governadores..), sabemos bem como foram feitas as privatizações, com dinheiro do BNDES, mas isso é uma longa história…Chávez sempre consultou o povo para as suas mudanças, só lembrando novamente que dentre os temas polêmicos desta última, estava o aumento da seguridade social. Quem pode ser contra isso a não ser as elites de sempre? Lula é tão socialista como FFHH, Alan Garcia do Peru e Carlos Andrés Perez da Venezuela são social-democratas, é bom que se diga… Chávez perdeu por pouquíssima margem assim como a abstenção foi alta. Parece claro que parte do eleitorado de Chávez estava indiferente ao pleito. Também significa que não estavam apoiando as elites venezuelanas que sempre gozaram das riquezas promovidas pelo petróleo sem ligar p/ as necessidades dos pobres. É bom lembrar que Chávez praticamente acabou com o analfabetismo e melhorou em muito os índices da saúde pública ( só citando que a grande imprensa paulista mostrou nesta semana que o estado de São Paulo apresentou os piores índices em ciências e matemática na prova anual de qualidade de ensino. Isso no estado governado por tucanos há muito tempo…). Falar que aqui vivemos numa democracia onde impera o poder econômico, onde só ganha eleições quem tem dinheiro, onde a classe baixa e média não são ouvidas sobre os problemas importantes do País; é de uma maldade ou desconhecimento sobre o significado da palavra, sem igual! É importante lembrar que assim como Fidel em Cuba, Chávez só endureceu depois que quiseram derrubá-lo em abril/2002. Não será uma forma dos poderosos de sempre tornar um governante idealista em alguém que mereça ser redicularizado, criticado e derrubado? Há que se olhar, caro Raul, todo o contexto sempre. Algumas considerações são necessárias; não vivemos aqui numa democracia, pois o povo só vota e nada mais. E sempre nos mesmos candidatos, aqueles que têm poder econômico. Outra, é que Chávez entendeu o recado e continuará suas mudanças p/ melhorar o país só que de uma forma mais lúcida. E finalizando: Graças ao Chávez há maior participação popular nas decisões na Venezuela. Aqui nunca vi governante fazer isso…Abs.
Raul,sugiro aos neo-latinoamericanos que assistam os filmes da mostra “Cinema e Direitos Humanos na América do Sul” para terem alguma idéia sobre a ebulição política no nosso subcontinente além das veiculadas pela Veja et caterva.Abraço
“DEMOCRACIA” ATACADA? Que “democracia” com aspas que é esta, o domínio secular de alguns sobre muitos a quem oprimem e impõe a fome e o atraso? O povo não fala o francês nem o espanhol como a elite, fala quétchua, os índios compõe a maioria e o Estado os ignora. Olha, já está na hora de revermos nossos conceitos: como pode ser “democrático”, na pergunta que já fez Saramago, um regime que mata, tortura e esfomeia? Será que a crença nesse capitalismo não é igualzinha a de Maomé? Qual a diferença? Como diria Maurice, pensar não dói!A alternativa bolivariana é um caminho e não será o bombardeio de uma mídia comprometida com idéias atrasadas que nos fará mudar de idéia.
Paulo Matos
Caro Raul: se o Chávez detém todo esse poder popular por que precisaria de tantos mudanças constitucionais para legitimar o que sempre poderia conseguir pelas urnas? A história do Chávez lembra aquele desenho do ratinho Cérebro (“o que faremos amanhã? o mesmo que fizemos hoe, conquistar o mundo!”; isso daria uma ótima charge). No Brasil, temos exemplos memoráveis do próprio Lula que não precisa mudar nada para se releeger ou eleger o seu sucessor: faz tudo sempre certo! O Getúlio, o JK etc